quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Sobre o Shadenfreude.

Muita gente diz não entender como alguém pode se deleitar com o sofrimento alheio. Acusam o capaz de ter Shadenfreude de sádico prontamente. Bem, sadismo é uma possível razão, mas é certo que não há tanta gente acometida dessa doença quanto há gente que aprecia o sofrimento alheio. Os outros pequenos corações que tripudiam sobre a desgraça nada mais são que crentes da justiça do universo.

Sei bem que esta é uma das minhas opiniões mais difíceis de engolir, mas eu sempre faço questão de explicar o que digo, não vai ser diferente desta vez. Partamos do que é justiça e do que o senso comum tem como justiça. Justiça é o conjunto de atitudes tomadas por um indivíduo ou por um grupo de pessoas, geralmente numa situação de poder em relação a um ou mais indivíduos, cujo objetivo é manter o equilíbrio dos ânimos. Não é o ideal belo que é pregado ou muito menos o valor absoluto que supõe o homem médio.

Não é a primeira coisa porque a justiça, embora extremamente romantizada, não é um valor que acompanha conotação alguma em si só. Pode parecer absurdo, mas é bem simples: associar justiça com bondade é mero costume social, não algo inerente à justiça. Trata-se de equilíbrio, não de benevolência. Não é fazer o bem, é manter a ordem.

Não é a segunda coisa porque não há valor absoluto. Ser justo em uma situação significa uma coisa em uma sociedade e outra em um grupo com regras sociais diferentes. E ainda que num mesmo grupo social, diferentes indivíduos podem encarar determinadas intervenções como justas ou não, dependendo de seus desdobramentos. É muito comum entender a decisão que não nos favorece, mesmo sendo a mais sensata segundo os preceitos morais, como injusta. Tomasse por injusto tudo que não favorece como deveria.

É da natureza do homem médio não aceitar que um valor que este julga importante vai de encontro ao que ele deseja. Ainda mais um valor tão enobrecido como a justiça. Prefere-se subverter o valor a aceitar-se como "mal". Dito isto, creio que ficou bem claro onde quero chegar: o homem miserável vê como justiça divina o sofrimento alheio pois é 'justo" que todos tenham que ser tão miseráveis quanto ele.

A justiça vulgar do homem médio nada mais é que desejo pela satisfação pessoal. Motiva sentimentos como Shadenfreude e a vingança. Mas é evidente que nada disso é justiça, é pequenes de espírito, digamos assim. A justiça beneficia o conjunto, jamais o indivíduo apenas. E quando não se percebe isso, fica impossível ser juíz imparcial do que quer que seja.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Sobre o lado ruim de certas qualidades

Quem me conhece um pouco sabe que a minha visão de mundo não é maniqueísta. Eu passo longe de qualquer visão extrema. Daí não me caberia, jamais, acreditar que existe algum traço de personalidade que seja completamente benéfico.

Todo aspecto do carater humano que é visto como positivo tem seu lado menos agradável. Qual o mal poderia haver em ser auto-confiante? Nem me prenderei a lugares comuns aqui, como o problema da arrogância: minha filosofia é barata, mas não tem preço de banana ou de psicologia. E além da minha indisposição de falar sobre assuntos batidos, meu argumento nem sequer toca a esfera do exagero. Proponho que até auto-confiança sob medida tem seus contra-tempos.

Tome a pessoa segura em si como objeto de estudo. Que se espera dela, se não que permaneça segura, que não fraqueje e que siga por qualquer turbulência. Se o faz, torna-se modelo. Aplaudam-na, a forte. Mas se um dia, em sua humanidade, este exemplo ceder à insegurança? Não é impossível, ele tem medos e anseios tal qual qualquer outro ser de sua espécie. Mas isto lhe é "proibido", veja bem. Se por um momento ele tropeçar em seus problemas, os olhares do mundo que o cerca o condenarão. Exagero meu? Não. Nesse mundo, não é que apenas não se espere que os fortes jamais caiam: o direito a essa faceta da humanidade lhe é negado.

A fraqueza do de ações nobres é a última a ser e mais difícil de ser perdoada. O confiante não pode sentir-se inseguro. O otimista não pode duvidar. O alegre não pode sentir o gosto da tristeza. Parece que o homem que tenta se edificar torna-se vítima de sua própria condição de ascensão:"queres ser belo e forte? então nenhuma falha ser-te-á natural".

É uma condição angustiante. Mas o exemplo, se realmente for exemplar, aguenta também mais este peso em suas escolhas. Não é fácil deixar para trás vícios da alma, digamos assim. Mas, a humanidade de um sempre será reconhecida por quem for pelo menos tão humano quanto ele. Os juízes dos fortes precisam destes. Por isso não permitem que sejam menos que perfeitos. Rodear-se de juízes de caráter será fatal, mas isolar-se completamente deles não permitirá que se perceba o erro. Então, o que deve o bom fazer?

O ser exemplar, que deve entender ou tentar entender o mundo de juízes e iguais, deve se inserir em ambientes formados por pessoas capazes dos dois comportamentos. Rigor e aceitação, todo homem, forte ou fraco, acaba precisando de ambos. E enquanto o exemplo não for capaz de ser por si só, deverá saber como lidar com isso.