quinta-feira, 31 de março de 2011

Sobre sorte II

Sorte é um conceito ambíguo que depende da inclinação pessoal a interpretar o acaso como bom ou ruim. Defino-a assim porque me parece óbvio que o otimista se considere bem mais sortudo que o pessimista, dadas as mesmas circunstâncias. Hoje mesmo passei por uma experiência que me fez aplicar esta conceituação: esperei o doutorando com quem faço IC por mais de uma hora, até ligar para ele e descobrir que ele me havia avisado por e-mail que não viria por estar doente. A questão é que este e-mail foi enviado depois de eu ter ido dormir e eu não tenho o hábito de checar meus e-mails na faculdade.

Dada a situação acima descrita, uns diriam "nossa que azar, esperou a toa". Já outros, eu incluso, sabendo que eu tenho provas amanhã e de qualquer forma precisaria ir embora mais cedo hoje diriam "que sorte a sua!". Afirmo que ambos os grupos estariam certos, por sorte ser um conceito flutuante e nada absoluto.

Disso quero extrair também o atrelamento do conceito de sorte ao grau de informação sobre uma situação. Sem que dissesse precisar do tempo extra que ganhei, restaria apenas aos muito otimistas declararem que ainda tive sorte, visto que ganhei uma tarde de folga. Ora, tão válido seria o argumento que tive azar de qualquer forma, por ter desperdiçado tempo de descanso. Declaro também, portanto, que não há sorte ou azar, há disposição de encaixar determinados acontecimentos em categorias.

E eu, que categorizo tudo, já descrevi vários outros aspectos da psique humana que são categorizados. Assim, A base do meu argumento aqui não será apenas a de que esse conceito é arbitrário, já que sua arbitrariedade é inofensiva, mas sim de que é igual o direito do sortudo de se declarar assim ao direito do azarado de o ser. Nem fome na África, nem unha quebrada, não há mal pequeno ou grande de mais que possa realmente privar o homem de suas emoções, a não ser que ele permita.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Sobre irritabilidade.

Todos, até os mais bem humorados, às vezes ficam irritadiços. Faz parte da natureza humana, nada de alarmante nisso. Hoje estava nesse estado deplorável de me aborrecer por pequenas bobagens, consequência direta de um péssimo dia na faculdade e proximidade das provas. Mas então, enquanto caminhava para a academia e reclamava sozinho de um professor, vi um mendigo levantar e começar a dança do joelho junto. Nunca vi uma bobagem ser tão precisa. Na mesma hora, esbocei um sorriso enorme e todo o meu aborrecimento pareceu ridículo. Nada importava além daquele espírito livre fazendo o que queria apenas porque queria.

Isso me fez refletir bastante sobre o quanto nos deixamos nos abalar pela rotina. O tédio, o stress e toda a pressão do cotidiano acabam riscando o que há de mais belo em qualquer pessoa: a capacidade de se alegrar com pouco. Pelo contrário, inserem em nós o péssimo hábito de ser irritável. Irritabilidade nada mais é que o caminho mais fácil de reação a adversidades do dia a dia. Encarar as coisas com leveza de espírito requer um desprendimento enorme e o ser humano é naturalmente controlador e tem medo do que não conhece. preocupa-se de mais com detalhes insiguinificantes e esquece de ter uma visão olística das coisas que o cercam.

Ter o espírito leve é frequentemente associado a ingenuidade e ser ingênuo é ser ridículo para um adulto. Ainda mais num mundo em que se preza a agilidade da mente, a esperteza. É justamente o contrário, afirmo veementemente que trata-se de outro valor invertido em nossa sociedade problemática: o espírito livre é o mais sábio de todos, enquanto o irritável é apenas um tolo mascarando sua preguiça de encarar a vida com uma atitude construtiva com seu mau-humor.

Essa postura é prejudicial a quem a adota e a quem está próximo desta pessoa. O exemplo ruim é sempre mais copiado que o bom exemplo, ainda mais quando aquele advém da inércia. Torna-se uma célula de depressão no tecido social. E quantas não são assim? Bem, abandonando o tom doutrinador, continuo fazendo minha parte. E esse camarada morador de rua/dançarino me lembrou bem que por mais que certos dias estejam ruins, tudo tem seu lado bom e o importante é não perder a postura do homem feliz.

terça-feira, 22 de março de 2011

Sobre fotografia e imagem pessoal.

É uma coisa aparente simples, mas icônica. Boas fotos imortalizam momentos únicos. Seja em reuniões entre amigos ou numa guerra, esse registro imediato de uma situação é realmente algo valioso. E poderoso. A foto pode ser manipulada e provar pontos inexistentes. E pode alimentar ou destruir egos, dependendo do seu uso.

E é de egos que quero falar. O orgulho humano vive da impressão alheia, isso é fato, mas eu não condenarei o orgulho agora, já falei disso e não gosto de me repetir. A perspectiva aqui é um tanto diferente: o que é o "eu"?

Nada mais que o conjunto de características que definem o indivíduo. Mas você não precisa perder seu precioso tempo me lendo para saber disso, é intuitivo. Será? Qual a real definição de caraterística? O ser é a oposisão do não ser, por fim. Sabemos bem mais sobre o que não somos do que sobre o que somos, essa é a verdade. Daí parte a criação do eu a partir do outro. Acontece que não apenas define-se o um pelo o não um, mas aquele acaba jamais precindindo da aceitação deste. Ou isso seria o natural a se concluir.

Peço que conceba então que a necessidade de aceitação pelo próximo é apenas fruto da necessidade da aceitação de se mesmo. Sim, com todas as letras é exatamente isso. Cada vez que se exibe ao mundo uma qualidade, na verdade está apenas pedindo-se a permissão, ou a tomando por força, como preferir, de varolizá-la. Coloco minha melhor foto no meu perfil virtual para mostrar o quanto estou satisfeito com meu melhor ângulo, mesmo que ele só exista depois de edição. Mais um mero caso da incansável busca pelo "bem", pela qual já demonstrei meu asco.

De que vale isso tudo? Vale a segurança. O ser humano só tem 3 reais necessidades, de onde derivam todas as outras: alimento, segurança e conforto, nessa ordem. E antes de continuar, devo ressalvar que a meu ver, existem dois tipos de orgulhosos: os orgulhosos em si e os orgulhosos em outrem. Os primeiros diferem dos segundos pois não padecem da doença da aceitação. Mas isso não seria contraditório com o dito por mim logo no começo deste post? Não, nunca me contradigo. Precisar e ter uma patologia são dois universos diferentes. É patologia buscar uma perfeição virtual a fim de preencher vazios emocionais, disso trata-se o que escrevo.

Corpos perfeitos tentando mascarar mentes pequenas e corações ainda menores, usando fotos como instrumento da própria alienação. É minúsculo o homem que não se conhece e nem deixa que o mundo o conheça de verdade. Tão pequeno que me cansei de falar sobre ele e encerro aqui minha pífia análise.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Das novas experiências.

Dia desses comecei a participar de umas reuniões de certo grupo. Fui por curiosidade, devo ficar por mais curiosidade ainda. A primeira era apenas de saber do que se tratava aquilo que chamam de Movi e a segunda é fruto do interesse em conhecer melhor as pessoas que o compõem. Engraçado foi perceber que mesmo meus amigos não esperavam me ver por lá, talvez eu não me encaixe no perfil. Mas eu me diverti, juro.

Esse tipo de contato com o novo é bem agradável, ainda mais para alguém que se entedia tão fácil quanto eu. Às vezes até minhas velhas idéias me irritam e cansam, não por eu ter mudado radicalmente de ponto de vista, mas porque ao passo em que concordo com o que eu mesmo disse há tempos, sinto-me um tanto estagnado. Eu preciso ousar.

Entristeço-me em perceber que não tenho ousado tanto quanto gostaria ou sinto que deveria. Sim, é meu dever comigo mesmo ser inovador. Meu blog não seria o melhor exemplo disso, tirando-lhe o nome, é só outro blog. Para mim é único porque é 100% meu, mas não se destaca em nada de outros tantos outros. Onde está a ousadia nisso?

Cada vez que respiro novidade, eu acelero. Não, eu não tomo o novo no lugar do velho, não só por influência externa. Aliás, a minha real fonte é não outra se não eu mesmo. Minha alegria pela novidade é bem mais a boa e velha curiosidade sendo satisfeita do que uma necessidade de reciclagem de idéias. É claro que isso se inclui no pacote, mas eu já faço uma boa faxina mental com boa frequência, boa o suficiente até para ser capaz de acomodar o novo com facilidade. Eu anseio pela variação apenas para ter nuances do todo.

Então, devo admitir, estou animado com as possibilidades que tenho em mãos agora. Portanto eu não poderia pedir mais do que além de uns detalhes chave continuarem a se encaixar. Meu paradoxal amor pelo diferente inclui uma detalhada preparação e planejamento das minhas atitudes em relação a ele. Sim, não sou impulsivo, pelo contrário: calculo cada passo. Mas como tomo minhas decisões quase que instantaneamente e tenho assim aproveitado bem as oportunidades novas que tem surgido. Espero continuar assim, para que o tédio não me engula.

terça-feira, 15 de março de 2011

Sobre o homem obstúpido.

Um clichê que se aplica perfeitamente a minha situação agora é "você só sabe o valor de algo quando o perde". No meu caso, nem cheguei a ter, mas perdi a ilusão de poder. Eu me sinto fraco e ao mesmo tempo, atônito. Não que a minha condição seja surpreendente, mas a morte da esperança não é exatamente algo de fácil digestão.

Queria e ainda quero, mas meu desejo que parecia tão vago e distante se mostrou bem mais ardente do que eu mesmo o valorava. Assim, reduzido a minha impotência de entojado, resta-me apenas teorizar sobre todos os poréns. Prática que digo abominar, mas que sempre me assombra, como a qualquer mortal, em momentos como este. O que poderia ter sido, acontecido, experimentado. De ilusão se alimenta a alma pequena e a minha é minúscula hoje.

Fraqueza? Humanidade! Reconheço e reafirmo a minha sempre. Não me envergonha, pelo contrário. Não terei jamais se não orgulho da minha condição, mesmo miserável e triste como é hoje. É de minha natureza ter o nariz erguido mesmo quando derrotado. Pedância minha. E é fácil ser pedante quando se está pronto para cair e tem sua queda amortecida pelas circunstâncias. Mas toda queda, mesmo a mais suave, não é fácil. Há tanto para digerir, mesmo tendo deglutido tudo.

Eu sou o homem obstúpido, atônito, surpreso. Caiu em mim a verdade que eu já conhecia, só precisava que fosse pronunciada. Teima minha diante do inegável. Porém, quem pode culpar o apaixonado por ser sonhador, se é o sonho a essência da paixão? Um canalha poderia fazê-lo e eu sou desse tipo de canalha. Rirei de mim por ser natural. Rirei do mundo que me aceita e me entende. Rirei da minha desgraça até que não seja mais desgraça, mas comédia. Cada um tolera a decepção como lhe convém.

domingo, 13 de março de 2011

Da dança e manifestação pessoal.

Não parece muito meu estilo falar sobre algo desse gênero, meu texto costuma tratar de reflexão e sentimento. Mas creio que a dança cabe perfeitamente nessas categorias. O que pode causar estranheza, devo admitir, vai ser meu tom bem mais lúdico e menos frio, mas há dias de humor para isso também e este é um desses.

Não sei dançar. Não no sentido tradicional de se movimentar de forma elegante ou conexa acompanhando um ritmo, nem no sentido de ter alguma noção do que estou fazendo, mas talvez justamente por ter que quase sempre ser um observador eu tenha aprendido a admirar quem sabe dançar. Dança é música feita com o corpo e música é a arte sublime.

Lembra a oratória, de certa forma. Em vez de palavras, movimentos desenham um discurso e contam uma história. Convencem, comovem, dominam. Não danço, mas falo e cultivo a idéia de haver equivalência. Não falar por falar, isso é o mesmo que um péssimo dançarino tentando impressionar com sua falta de habilidade. E de certo, alguns discursos me lembram uma "dança do joelho junto" em palavras: risíveis, no máximo.

Falo bem sério dessa intimidade entre fala e movimento. Qualquer pessoa que tenha o mínimo de curiosidade sobre semiótica concordará comigo que minha associação é no mínimo justa. Não só o movimento coreografado, mas o involuntário também. O tarólogo sabe disso, o flertador domina essa segunda língua.

Isso tudo listado apenas para clarear as idéias. É exercício divertido admitir uma falta de habilidade apenas para mostrar que possuo uma outra equivalente. pelo menos eu aprecio a noção de dançar com palavras e gestos pequenos.