terça-feira, 19 de abril de 2011

Sobre comunicação

Eu nunca te compreenderei plenamente, caro leitor e vice-versa. Mas talvez isso seja o menor de nossos problemas. Sendo assim, continuo esta farsa na esperança de que o essencial de minha mensagem não se perca.

Ora, mas que farsa seria essa? Bem, a farsa da escrita, é claro. De forma mais abrangente, a da comunicação. Pareço louco? Explico-me, então: Toma um pensamento teu, aquele qualquer e genérico. Tranforme-o em palavra escrita. Transmita-o para mim. Eu o leio e formo novo pensamento. É o mesmo? Sabes que não. Sabes bem que não. Setia impossível não perder ou acrescentar significados a esse pensamento em todo este trajeto. Paro de tergiversar: meu ponto hoje será a crítica relação entre pensamento e comunicação e como a segunda corrompe o primeiro.

Toda tradução muda o sentido das coisas, mesmo que levemente. E comunicar-se é traduzir pensamento em signos. E de todas as formas de comunicação, creio ser a escrita a que comete os maiores pecados semânticos. Textos não possuem um tom específico ou contexto ou sinais corporais. Pelo menos não obviamente. Exige pesquisa para se entender bem a um texto como se entende uma conversa olho no olho.

E não há pesquisa na maioria das leituras. Somos levianos em boa parte das vezes, inferimos detalhes da simplicidade e construímos andares diversos sobre o mesmo alicerce. A livre interpretação é perigosa. Não que a liberdade seja um perigo, é a manipulação. Levo um texto comigo pelo caminho que desejo, quando a palavra dita se deixa levar muito menos, pois não foi só ela que o interlocutor deu como objeto de significado. Cada detalhe de suas expressões funcionou como signo que foi perdido na trasncrição. Os realistas tentaram mixar ao texto essa avalanche de informações da imagem, mas o resultado foi bem mais chato que informativo.

Ora, mas se não nos entendemos, para que nos comunicarmos? Que perda de tempo! Não. É vital que mesmo nos sendo estrangeiros em termos de comunicação, somos todos cidadãos da pátria humana. Eu te entendo como posso, tu te comunicas como te convém. E eu e tu somos necessários um ao outro, é uma parceria benigna a ambos. Quando eu te falo, tu te entendes mais humano ao tentar me entender. Eu me entendo mais humano ao tentar me fazer entender. E esta simbiose se prova não só útil, mas básica.